xmlns:og='http://ogp.me/ns#' A dez quadras daqui.: Palestina #7 - Aquilo que postei no Facebook

sábado, 31 de maio de 2014

Palestina #7 - Aquilo que postei no Facebook

Esse post é uma compilação de algumas coisas que escrevi no Facebook. A ideia é colocar tudo aqui no blog pra ficar mais fácil pra quem quiser ler, já que meu FB é fechado, e pra eu conseguir me organizar também.
Ficou longo, mas..
Hope you enjoy it!

Handover - escrito em 07/04/14



A foto é de uma frutinha selvagem que encontramos hoje lá no Vale do Jordão enquanto a gente ia ver uma nascente que ainda está funcionando pra distribuir água pros palestinos, mas que daqui uns tempos, quando ficar mais calor vai diminuir (ou esperamos que não, que esse ano seja diferente) por que os colonos pegam essa água pra irrigar suas plantações (eles são colonos e tem água encanada, mas pegam a água da nascente). Isso tudo depois de ir em Mak-Hul para acompanhar a plantação de oliveiras em uma terra recuperada por palestinos. Uma terra que foi tomada pelo exército israelense, mas que estava sendo tomado por colonos para plantação (ao lado do mesmo terreno já existe uma plantação ilegal). Como sempre o exército estava lá, e em algum momento tentou fazer com que as pessoas não plantassem em toda terra. Nós ficamos lá mais ou menos 3h, e logo que fomos embora o exército confiscou os caminhões de água dizendo que estavam em área militar. Ninguém tem como prever, parecia calmo quando fomos embora, mas o fato de não ter uma presença internacional no local foi o suficiente pra acontecer algo irregular.

Acho que é isso, e bem, apesar de tudo que está acontecendo aqui, é um lugar maravilhoso, com um povo incrível. E vocês deviam vir aqui, fazer queijo com a vizinha também.


Qaryut - escrito em 19/04/14


Era pra ter chovido, mas não choveu.
Um acordo de paz deveria ser assinado, mas não foi.
A bomba de gás lacrimogênio não deveria ser lançada, mas foi.
Uma criança foi presa, mas não devia.
Árvores foram cortadas, mas deveriam dar frutos.
Terra foi roubada, e deveria ficar com o dono.
Um pastor foi agredido mas no dia anterior ajudou o agressor.
O exército atirou bombas de gás na escola em vez de garantir a segurança dos estudantes.
Era pra tudo ser multiplicado, mas foi queimado.
Era pra ser de todos, mas agora, é só de alguns.
Era pra ser lindo, mas agora é opressão.
Era pra ser uma oração, mas ontem choveu bombas de gás em Qaryut.



A foto é da primeira vez que fomos a Qaryut, aqui na frente a mesquita e lá atrás uma colônia ilegal israelense. Ontem fomos ao protesto como presenta protetiva aos moradores da cidade que tiveram as terras e a estrada confiscada pelo exército. O protesto era simples, fazer a oração do meio dia na terra confiscada e voltar para casa. Mas lá, antes mesmo de a gente chegar o exército israelense já estava no morro, impedindo o povo de descer até a estrada. Foi lindo, eles oraram e no final, em inglês, falaram pro exército que eles tinham acabado e estavam voltando pra suas casas, e que na próxima sexta lá estariam eles de novo, pra lembrar que a terra é deles. Nessa mesma hora um conhecido passou e disse "EAPPI, agora é melhor vocês subirem, pro bem de vocês". Nem mesmo cinco minutos depois, quando o povo já estava há uns 200 m do ponto da oração, o exército começou a lançar bombas de gás entre nós e pra cima do morro onde alguns esperavam e pra onde a gente deveria ir.
Sabe, bomba de gás dói, muita gente sabe disso. Bomba de gás quando não se tem motivo algum pra sentir a fumaça dói mais. Mas bomba de gás toda vez que você busca o seu direito dói mais que só na hora, dói dentro, dói na alma, na mente. E aqui, sempre é hora de bomba.

Bethlehem - escrito em 08/05/15


Essa é a paisagem da janela do meu hotel aqui em Belém. Do lado de cá os palestinos, do lado de lá os israelenses. Um pouco mais a direita um checkpoint por onde as pessoas que trabalham do outro lado do muro tem que passar todos os dias, passando por filas gradeadas, detectores de metal e mostrando sua permissão para a travessar.
Algumas vezes acontece de o soldado não deixar a pessoas cruzar sem nenhum motivo aparente. As vezes a pessoa descore que faz parte de uma lista negra. AS vezes ela pode ser irmã de quem está na lista negra. As vezes o soldado só não está afim de fazer rapidamente o trabalho.
A construção do muro não é ilegal. Todo país que quiser construir uma barreira na fronteira pode fazê-la. Mas aqui, nem sempre o muro é construído em cima da fronteira, mas sim dentro do território palestino, tirando o direito à terra de quem é o seu proprietário.
O checkpoint também não é ilegal, em todas as fronteiras existem guardas que conferem seus documentos. Mas aqui as condições do checkpoint e a forma com que as pessoas são tratadas, comumente humilhadas é que é o problema. E bem, caso a pessoa em questão seja israelense ela não precisa passar por tudo isso.
Bem...
Make hummus, not walls.

Tawayel novamente - escrito em 12/05/14


Duas semanas atrás Tawayel sofreu com demolições e três famílias ficaram sem onde morar. Há dois dias duas casas novas ficaram prontas, hoje de madrugada o exército apareceu lá de novo, e demoliu as novas casas, os banheiros e confiscou as tendas onde as famílias estavam morando.

A vila fica em área C, comandada por Israel, onde constantemente o exército confisca terras por motivos de segurança. Essas terras são fechadas para seus donos, e segundo a lei, se o dono não usar a terra por 3 anos ela se torna propriedade do estado. Normalmente essas terras são agregadas ou se tornam novas colônias ilegais israelenses dentro do território palestino. Outras vezes, em área C acontece como em Tawayel: casas são demolidas após serem avisadas por uma ordem para parar a construção. Comumente as casas já existiam muito tempo antes da ordem e estavam passando por alguma reforma ou manutenção. As vezes as casas simplesmente recebem ordens de demolição por estarem muito perto de terras ou estradas usadas por colonos israelenses. E a desculpa é sempre a mesma: segurança.

Sobre a 1ª demolição:
http://adezquadrasdaqui.blogspot.com/2014/04/palestina-4-demolindo-casas.html

Tawayel 3 - escrito em 18/05/14



Hoje, as 07:10h da manhã recebemos uma ligação de Tawayel, de novo a Administração Civil estava lá, com 3 Jeeps da polícia de fronteira. Quando chegamos lá vimos eles confiscando as 3 barracas onde as famílias estavam morando e uma betoneira. Do outro lado da vila uma ordem para parar a construção.
Segunda passada 2 casas (recém construídas) e 3 banheiros foram demolidos, e, 4 barracas e 1 lona usada pra cobertura na antiga mesquita foram confiscados.
Antes disso, no dia 29 de abril, 3 casas, 1 abrigo de animais, os banheiros e a mesquita.

Por que as pessoas não podem morar em suas próprias terras? Área C é a resposta.

Jiftlik Abu Al-Ajaj - escrito em 24/05/14

Foto: Sarah

Hoje nos fomos para Abu Al-Ajaj, no Vale do Jordao, onde, nessa quarta feira 36 estruturas foram demolidas. Por enquanto eles tem 10 barracas para morar, ddas pela Red Crescent, um banheiro portatil e a agua vem num caminhao pipa de uma vila ao lado. As ovelhas continuam no sol, a eletricidade vem de um "gato". E ha a possibilidade de o exercito voltar para demolir mais casas. A desculpa dessa vez foi a falta de permissao para construir.
A vila e vizinha de uma colonia ilegal israelense.

P.S. pós facebook: Essa barraca foi desmontada no dia seguinte por medo de o exército aparecer de novo.

Qalandya Checkpoint - escrito em 26/05/14

Foto: Ingar

Diariamente os palestinos que tem permissão para trabalhar em Israel passam por checkpoints como esse. Adultos com crianças, idosos e internacionais podem atravessar de ônibus, onde a permissão ou o passaporte são checados.
Todas as outras pessoas tem que descer do ônibus e entrar numa fila gradeada e esperar para passar em um dos guichês com detector de metal e mostrar a permissão para passar para o outro lado.
Em alguns checkpoints em um período de 2h chegam a passar até 8 mil pessoas, especialmente entre 4h e 6h da manhã.
Nesse dia passamos pelas 9h e tinham mais ou menos 10 pessoas na 1ª fila. Passamos a roleta e entramos na fila do guichê, depois de 3 pessoas passarem o guichê foi fechado e fomos para outro. Durante o tempo de espera vimos um homem que teve que voltar várias vezes e tirar mais coisas do bolso, sapatos, acessórios (assim como nos aeroportos), mas após alguns minutos ele foi autorizado a ir para o outro lado. Outro homem, que tinha a permissão na mão foi recusado, não se sabe por que. As vezes depende do humor dos soldados, as vezes podem dizer que é uma permissão falsa, as vezes a pessoa está na lista negra por ter participado de alguma manifestação, ser parente de algum preso, ou algum outro motivo. As outras pessoas passaram razoavelmente rápido.
No total, desde que entramos no checkpoint Qalandya, entre Ramallah e Jerusalém, foram 40min pra atravessar mais ou menos 30m. E posso dizer que não é uma experiencia muito boa, então só posso imaginar o que é fazer isso com mais 5mil pessoas.

Barreiras no Vale do Jordão - escrito em 27/05/14



Essa foto contém 4 imagens muito comuns aqui na Palestina.
- O aviso de cimento é um aviso de área de fogo, ou seja, área que o exército confiscou terras para treino.
- O aviso vermelho é: "esta estrada leva para área A, sob autoridades palestinas. A entrada para cidadãos israelenses é proibida, perigosa para sua vida e proibido pela lei israelense."
- A barreira de metal é um bloqueio para que os palestinos não usem a estrada.
- O monte de terra (nesse caso, terra nova, marrom mais escura) são bloqueios para que carros, tratores, e trabalhadores não passem para o outro lado da terra sem pedir autorização para o exército.

- Desde 67 o exército israelense começou a confiscar terras de fazendeiros no Vale do Jordão para usar para treinamento. Parte dessas terras ainda são usadas para esse fim, outras, após alguns anos se tornaram colonias ilegais israelenses e ainda algumas não são usadas e nem devolvidas aos seus donos. Enquanto essas terras vão para nas mãos dos colonos novas terras vão sendo confiscadas dos palestinos, para novos campos de treinamento. Até hoje alguns treinamentos são feitos próximos a residências, naturalmente causando desconforto e levando algumas pessoas a saírem de suas terras e por consequência o exército tomando posse da mesma.
- A Palestina está dividida em 3 tipos de áreas, A, B e C, sendo que A está sob autoridade palestina. Em área A, estão as grandes cidades; as vilas em área B, onde a autoridade se dá pela "colaboração" entre governos da Palestina e Israel; e a área C que está sobre total domínio das autoridades israelenses, e, onde está o Vale do Jordão.
- Estes portões em estradas são encontrados por todos os lados por aqui. Alguns costumam estar abertos, outros tem hora pra abrir, outros estão sempre fechados. Ou seja: o palestino que quiser ir para sua terra, tem que pegar uma segunda estrada que, comumente, é no mínimo o dobro mais longa que a bloqueada. Colonos israelenses podem passar pelos portões a qualquer momento.
- Os morros de terra são encontrados em estradas e campos onde o exército/governo israelense não quer que os palestinos passem. Nessa foto esse é o fim de um morro de mais de 3km impedindo que os fazendeiros cruzem a estrada principal para trabalhar do outro lado da via. Nesse caso além do morro ainda existe uma vala em algumas partes pra impedir os caminhões de passar por cima da terra.


Jalud - escrito em 31/05/14


Esse é Kemal, ele vive na Vila de Jalud que fica próxima as colônias ilegais israelenses Ahiya e Esh Kodesh. 
A casa que ele vive e as casas de seus irmãos há alguns meses tem que ser assim: com grades nas janelas. Não as grades decorativas que vemos aqui por todos os lados, mas uma tela de arame. O que aconteceu foi que há 7 meses atrás essas casa foram atacadas por colonos com os rostos cobertos e todos os vidros foram quebrados. Além disso, eles bateram com uma pedra na cabeça de uma das crianças da vila e até hoje ela tem a cicatriz.
Eles vivem no extremo da vila, a mais ou menos 300 m de Ahiya, quase no topo do morro, mas as crianças não podem brincar lá por que todos tem medo que os colonos achem que é provocação e ataquem novamente.
As grades foram doadas pela organização francesa Premiere Urgence.

Um comentário:

  1. Carina, muito bom te ler. E ver pelas lentes da tua câmera.
    É triste. E eu não entendo como ações terroristas de Estados (como o de Israel) são ora motivo de intervenção militar, ora motivo de proteção por parte da tal "comunidade internacional".

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